15 de abril de 2014

Crianças são seres naturalmente obsessivos. Quando é filho de outro obsessivo então…

Lembro de um travesseirinho que eu carregava pra tudo que é canto. O chamava carinhosamente de “xexelo”. Xexelo tinha macela dentro, erva que dá sono. Vai ver que é por isso que cresci assim, boa de cama. Qualquer hora é hora. Treinando feito uma ginasta chinesa perto das Olimpíadas fica mais fácil ainda.

Eu era obsessiva com o xexelo. Assim como tem gente que só dorme com frontal, eu só dormia com xexelo. Eu já tinha vomitado no xexelo. Babado no xexelo. Provavelmente, mijado no xexelo. Minha mãe tentava me dar outros, mas o xexelo era insuperável.

Miss you, xexelo.

Bento veio de uma obsessiva de nascença. Acho interessantíssimo como ele desenvolve suas manias. Em geral, não são manias copiadas da mãe, saem de dentro dele e é isso que me admira.

Começou com CDs. Sem dúvida foi a sua primeira obsessão reconhecida, depois do meu peito, claro.

Bento acabou com to-dos os CDs da casa na sua obsessão de rodar as coisas. Salvei a Beyonce, as ultras, o Renato Russo e o vídeo do seu nascimento. Se foi LuLu Santos, Gadú, Djavan. Se foi uma galera. Uma discoteca de CDs arranhados obsessivamente pelo meu pequeno Dj. Ele girava e tacava CDs pela casa o dia inteiro. Quando ia subir escada, jogava o CD no degrau acima e subia, pegava, jogava no outro e subia mais um degrau. E assim por diante. Uma obsessão legítima!

Atualmente, no auge dos seus quase 2 anos, estamos na fase obsessiva das chaves. Na verdade, está na fase obsessiva do encaixe. O que engloba pequenos detalhes do dia-a-dia, como chaves e tomadas.

CDs eram menos estressantes, apesar do barulho que geravam ao serem massacrados contra o chão. Nem preciso dizer que ver seu filho tirando e colocando a extensão na tomada a cada 15 segundos é enlouquecedor.

“Você vai tomar choque!” – grita a mãe louca que nessa hora caga pra qualquer pedagogia e só imagina a criança sendo lançada para trás com os cabelos arrepiados e a cara preta que nem nos desenhos animados.

Outras horas, agacha, olha no olho, conversa e? A criança continua. “Eu falei com a parede?” Aham. Só que uma parede que escuta, entende e ignora.

Mas pensa que fascinante deve ser encaixar e desencaixar dois pinos na parede de forma bem sucedida e, que ainda por cima, ligam e desligam o ventilador? Compreendo a obsessão, até liberaria… Liberaria por questões filosóficas: EU NÃO MEXO COM QUEM TÁ QUIETO. Porém, toda regra tem sua exceção e esta se refere a sua própria saúde. Tenho que manter Bento vivo e sadio. Tomadas ameaçam essa regra.

E as chaves? Ah, não é tão mal assim, vai… Nem tem risco de morte! A não ser que ele engula, mas isso você resolve se mantendo bem atenta e não deixando uma única chave isolada na sua mão. Bento quer encaixar chaves em cada fechadura que a gente passa. É super bacana. Principalmente, quando estou com pressa, o que é bem frequente.

Às 5:30 da manhã, temos que sair de casa. Destranco a porta e ele já está aos berros.

– Calma! Não grita! Os vizinhos estão dormindo!
– Ahhhhhhhhhhhhhh

Sou obrigada a sustenta-lo no colo para que ele tente encaixar a chave. O dia todo. Ok. Não mata. Só irrita certas horas. Quando estou com tempo, deixo ele fazer o exercício váaaaarias vezes pra compensar minha falta de tempo de outrora.

Semana passada, Bento estava na pracinha e fui encontrá-lo para liberar a Fátima. Disse ela que ele estava roubando o lanche das crianças da pracinha.

Ninguém alimenta essa criança, minha gente!

Fomos numa lanchonete de pastel de forno que fica em frente. Enquanto eu comprava, Bento segurava minhas chaves. Eu dava minha primeira mordida no pastel quando…

– Senhora, seu bebê está comendo a chave. – me disse um senhor que escolhia sua merenda.
– É.

Ele calou-se, mas continuava a olhar agoniado pro Bento. Eu olhava a movimentação da rua com ar de contemplação.

-Ele continua a comer as chaves…
-Aham.
-Pode machucar o bebê – insistiu o velhinho.
-Quer pastel, Bento?

Entendo que a intenção é boa, mas vivo no modo sobrevivência elegante, uma tentativa de controle de estresse. E claro, eu tava com um olho no peixe e outro gato, não sou tonta. Só tento desenvolver métodos que nos estressem menos.

Por exemplo, toda vez que eu deixava Bento na minha mãe para ir treinar, nossa despedida era um drama. Me maltratava ver Bento chorar com a minha partida. Ficava abraçando-o, beijando-o e explicando que eu voltaria para buscá-lo. Mesmo assim, o bicho continuava chateado. Minha mãe dizia para eu ir embora escondida pra ele não chorar, mas nunca fiz isso. Não achava legal.

Ficava sempre procurando uma solução para controlar esse tipo de estresse. Até que plim! Juntei uma obsessão com a outra. Agora, para me despedir, dou a chave na mão dele e digo:

-Bento, mamãe tá indo treinar, tranca a porta pra mamãe?

O moleque nem chora, fica tão empolgado com a obsessão de colocar a chave no buraco que esquece sua mais antiga obsessão: a mamãe.

Ótimo, menos estresse!

O que quero dizer é que crianças são obsessivas, teimosas, repetitivas e se você for o mesmo do lado oposto, a situação fica insustentável. Se está pensando em ser mãe, esqueça sua obsessão com limpeza, com organização, com horários, com padrões. Esqueça por dois motivos. O primeiro é que seu filho é um ser único. Independente do que você espera dele, ele terá suas peculiaridades. O segundo é que você se tornará uma máquina quebrada de dizer não. Além de ficar maluca e frustrada.

Acho que esse é o grande lance da maternidade… Endurecer sem perder a loucura. Se fuder no paraíso sem perder a ternura.

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