21 de novembro de 2013

Até 15 dias atrás, as únicas habilidades que Bento tinha com suas mãos eram:

– Rodar CDs. Um ou dois ao mesmo tempo.
– Puxar minhas blusas no intuito de me coagir e conseguir uma “bicada” no peito.
– Bagunçar a ração das cachorras pela casa.
– Virar o pote de água das cachorras.
– Dar belisquinhos enquanto mama.

Com 1 ano e 2 meses, Bento ainda não comia nada com as próprias mãos. Se eu desse na mão dele e o induzisse a levar o alimento à boca, ele gritava – puxou a quem? Se colocasse o alimento na sua mão, ele estraçalhava-o. Tudo bem. Entendo que a criança tem que sentir as texturas. Não sou lá a pessoa mais neurótica com sujeira. Mas tudo tem limite. Nunca chegava a hora dele colocar o treco na boca.

Aliás, por conta disso, Bento solto nunca foi uma preocupação. Havia uma suspeita de que ele estivesse aprendendo muitas coisas com as cachorras, e que o fato de não levar nada à boca, pelo contrário, de levar a boca até o alimento – já vi ele indo com a boca num biscoito de polvilho que estava na toalha de um piquenique, assim como, algumas vezes, levou sua boca ao meu prato para roubar um pedaço de frango. Era um sinal. Afinal, ele assiste suas irmãs levarem seus focinhos às suas rações todos os dias – e aos restos de sua comida. Natural que aprendesse algo com isso. Assim como Bento rosna quando a Pucca fica ofegante (quem tem um pug sabe como é), ele come como elas.

Comia.

E foi assim, num estalo, que ele começou a ser uma criança normal e fazer uso da sua oralidade. Num estalo. Como tudo que bebês fazem. Do nada.

Em uma semana, ele experimentou:

– Meu bastão de moxa de acupuntura
Chegou com a boca cheia de moxa carbonizada – PRETA- sorrindo pra mim. Em seguida, sentiu o gosto desgostoso e começou a fazer careta. Aí o que a mãe fez? Começou a rir. Depois, retirou o carvão da boca da criança. E riu de novo.

– Pedra
As pedrinhas humildes, cinzas, quietas na delas. Aquelas outrora analisadas meticulosamente por ele e, em seguida, arremessadas ao “Deus dará”. De repente, não mais que de repente, ele cansou-se de lança-las ao léu e começou sua desgustação. A sorte é que ele come a porcaria da pedra e me olha com uma cara de “coisa dura essa!” E lá vai a mãe arrancar a pedra da boca da criança louca voando!

– A ração das cachorras e do gato.
Nós sabíamos, caros leitores, nós sabíamos que esse dia ia chegar. Esse dia se aproximava e minha tranqüilidade de comer, escrever, respirar enquanto Bento revirava os grãos alimentícios, ia chegar ao fim. Pois é, não sou uma boa pessoa. Eu dava ração para o meu filho brincar enquanto fazia minhas coisas. Era o jeito, a solução, um cala boca de primeira. “Deixa que eu cato essa porra toda depois!” Acabou. E agora tenho que ficar ligada enquanto ele se distrai/alimenta com a ração. Já provou as duas, a do Ares e a das meninas. Aprovou, acho eu. Fica com uma cara de “hummm, sabor interessante…” Claro! Sabor salmão, sabor galinha caipira, sabor cordeiro. Quase um rodízio na Porcão.

– Sabonete
Catou o sabonete ainda envelopado e mordeu-lhe com plástico e tudo. Pelo visto não estava gostoso, mas o cheiro era agradável. Ri de novo. Ri muito. Ri tanto com a sua boca fazendo bolhas de sabão que não conseguia limpa-lo. “Você é uma mãe má, Fernanda, muito má!” Cuidei de arrancar o plástico com pressa. Outro dia, foi comer uma barra de arroz integral, mordeu o plástico e quase sufocou. Bento não tem paciência. Quer tudo pra ontem. A impaciência dele é o meu próprio cuspe caindo na minha cara. Me vejo. Virei Bento de cabeça para baixo, dei tapas e o plástico saiu. Tenso. Mas voltando ao sabão, no final, olhei pra ele e disse: “Filho, é exatamente isso que mamãe -a desbocada- vai fazer com você quando começar a falar palavrões.” Ri mais uma vez. A gente perde o filho, mas não perde a piada. (É brincadeira, hein, gente! Não sou a favor de nenhuma forma de violência. Não coloquem sabão na boca de crianças desbocadas dizendo que leram isso num blog. Pelamor!)

– Banana com casca
Uma coisa eu sei, enquanto houverem bananeiras no planeta Terra, Bento estará salvo. Vai gostar de banana assim lá na toca do King Kong! O garoto come banana o dia todo. E come colocando na boca pedaços enormes. E se não cabem na sua pequena boca, os atocha com as mãos. E se ainda assim não dá, baba banana para depois catar no chão e retorna-las ao destino. Ah! E o mais importante, nem assim tem prisão de ventre. Nessa nova fase de “levador de coisas à boca”, passa na fruteira, cata uma banana e traz para eu abrir. Se a impaciência reina ele me ameaça mordendo a casca. Tipo: “Não vai abrir não? Vou comer com casca, hein?” Mole não. Sua origem símia é dominante!

Agora, sua mãe, no caso eu, vive em constante alerta. Virou uma espécie de sensor cinético mandibular do filho e a qualquer movimento suspeito, dispara: “O que que você colocou na boca? O que você colocou na boca?” Sonha: “O que que você colocou na boca? O que você colocou na boca?” Respira: “O que que você colocou na boca? O que você colocou na boca?” A criança está só sorrindo e você: “O que que você colocou na boca? O que você colocou na boca?”

Oralidade, oralidade. Necessária e perigosa. Espalhando a vitamina “S” por toda uma nação. Afinal, o que não mata, engorda. E se não matou o Bento, existem grandes chances de o terem engordado.

– Deus, magnânimo, senhor de toda a sujeira da face da terra, beleza que o Senhor não matou o Bento, agradeço muito. Mas dá pra ter uma terceira opção? Porque se ele engordar a cada vez que comer uma porcaria dessas no auge da sua oralidade, não vai haver carrinho que o comporte, mãe que o carregue, roupa infantil que o vista. Com 5 anos terei que ver roupa na Redley para o garoto. Vamos mudar? O que não mata, engorda ou faz ficar rico. Mesmo que seja de saúde. Pode ser saúde e dinheiro, não vou me incomodar. Dinheiro sem tirar da saúde, tá? Mas engordar, não dá não, ok? Tenha misericórdia. Qual será o meu futuro? Tonéis de macarrão com salsicha? Tenha misericórdia.

Espero que Ele me ouça. Pedido sincero, humilde e desesperado. Imagina quantas caloria deve ter um sabonete? Casca de banana? Plástico? Cinza? Imagina se os ácaros mais ínfimos e mais medonhos são os mais calóricos? Melhor não arriscar.

Brincadeiras à parte, fiquei feliz que Bento esteja desfrutando do mundo através da sua boca – antes só desfrutava do meu seio rs. Assumo que ficava um pouco, não muito, preocupada com o fato de os seus amiguinhos já levarem coisas à boca há mais tempo que ele. Acredito que essa é a maior prova de que cada criança tem seu ritmo natural e que nós, enquanto cuidadorxs, não temos que ver nossos filhos como robôs programados para atender as nossas expectativas. Ou as expectativas de livros. É um exercício e tanto, mas vale a pena abrir espaço para eles deixarem crescer os seus galhos na direção do sol ou da sombra. Bento vai conquistando o mundo da maneira que bem entende. Eu só observo e cuido para que ele se mantenha vivo! Huahuahuahauhauhauhau

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