6 de agosto de 2013

Nunca escondi de ninguém. Nem de mim mesma. Peter pan é meu nome, muito prazer.
Imagine a historinha, mas não me imagine com aquela roupa verde caída. Sou uma criança. Sou papo pra muita terapia. Não pense em me colocar num lugar fechado, não pense em me impedir de descer pro play, não me exija tanta maturidade.

Até aí, ok. Fernanda se recusa a crescer. Sem problemas pro mundo. Problemas só pra ela.
Só que não.

A história que vou contar, quer dizer, a história que vou ter coragem de contar. Quer dizer, a história que vou ter a cara de pau de contar, seria normal se uma das 3 crianças da cena não tivesse 28 anos.

Isso, eu mesma. Uma mulher letrada. Uma mulher que corre com os lobos. Uma mulher que se enfia num barco e fica duas horas remando só falando com ela mesma. Uma mulher formada. Uma mulher, uma mulher que pariu, meu Deus do céu. Uma mulher independente. Uma mulher cheia de atitude. Uma mulher que discute política, religião, filosofia, feminismo, machismo, contração do transverso, fofoca da esquina. Uma mulher que… Uma mulher incrível! (Hãm Hãm)

Uma mulher, só uma.

O cenário? Uma festinha de criança. Os personagens? Eu, Bento e um ser idenficado como um garoto pentelho de 5 anos.

Já sacaram? Não?! Vou contar.

Na festinha de criancinha tinha uma casinha num parquinho. A casinha tinha janelinhas e uma portinha com maçaneta e tudo. A casinha tinha, inclusive, uma varandinha.

Bento está na fase de abrir e fechar tudo – muitas vezes, na sua própria mão ou pé – e se encantou com a casinha. Faz um mês que vem dando seus passos. Cada vez mais firmes. No entanto, ainda parece um bêbado cambaleando. Qualquer coisa se espatifa no chão e faz beicinho pra mim. Eu, dura na queda, mas com vontade de amassá-lo, digo “Vamos lá, levante-se! Aprender é assim mesmo!” Ele se encoraja e vai. Muito maneiro.

Tá, mas não era disso que eu ia falar.

Bento se encantou com a casinha. Saiu engatinhando loucamente pra lá, se levantou e começou a desbravar o espaço. Estava sozinho lá até que o meliante chegou. Entrou na casa e começou a tentar fechar e abrir a porta na cara do Bento. O pai estava do lado e não pude dar um bico no moleque. Já fiquei puta ali. Minha egrégora completa de erês insandecidos baixou.

O pai da criança, ou do delinquente, estava um pouco atrás de mim, imóvel, apoiando o massacre. Enquanto isso, eu cercava o Bento para protegê-lo. Nos intervalos fu-zi-la-va o menino com o meu olhar. Fu-zi-la-va.

[Dá licença, eu sou criança!]

Bento não conseguia brincar. O pentelho não deixava. Bento ia pra janelinha da direita, lá ia o pentelho. Bento ia pra esquerda, pimba. O pentelho na cola. Fora as tentativas maldosas de agredir o Bento que eu defendia.

Estava observando calada até que o pai do pequeno delinqüente saiu. Ahhhhhhh… Agora vai que é tua, Fernanda!

Ele segurava a porta e ameaçava fechar na mão do Bento. Segurei-a barrando a força dele e comecei o diálogo:

– Ele é só um bebê… Se você fechar, vai machucar a mão dele.- cara séria, tom nada dócil.

O menino só me olhava… E continuava sua perseguição ao meu creme brulé. Até que…

– Então, você não quer ir brincar de outra coisa? Deixe ele brincar aqui, vai… Ele chegou antes de você. – tom de saco cheio.

Não posso dizer que era um monólogo porque o rapaz me respondia com o olhar. Um olhar de quem me desafiava. Ah, mas eu não deixava por menos. Conheço bem esse jogo… São 28 anos nele, meu querido. Eu vou ganhar essa disputa e a casinha vai ser minha. Huahahaha Huahahahaha Huahahahaha!

Bento andou pra dentro da casa e se abaixou para pegar um brinquedo. O menino se antecipou e pegou da mão dele. Foi a gota d’água.

– Ei! Você não viu que ele estava brincando? – delicadamente, tirei o brinquedo do menino e dei pro Bento.- Se ele pegou, ele vai brincar disso agora, entendeu? Você procure outros brinquedos lá fora.

Fernanda, minha boneca, quantos anos você tem? – perguntou minha consciência.
Tenho 28 anos como mulher, mas como mãe tenho 11 meses. Sou uma criança.
Uma criança ridícula você quer dizer rsrsrsrsrsrs.
É… Isso mesmo ridícula, infantil e o que mais você quiser! Mexeu com minha cria, mexeu comigo! Meu cremutcho ali sendo atacado por um vândalo de 5 anos e eu vou deixar? Dá não!

Já estava quase expulsando o menino pelo braço quando…

– Fulano, vamos embora!

Respirei aliviada. Meus erês sentaram-se sorrindo com um ar de vitória.

O menino se retirou lentamente, me olhava no fundo dos olhos. Um olhar provocador.

Lá de longe, olhou pra trás pra ver se eu ainda estava ali.

Encontrou meu olhar e com a boca quase sem som, eu lhe disse:

– Ganhei.

THE END

Um beijo da vencedora

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