Fulano

Tenho sentindo a imensa necessidade de escrever sobre o meu vazio – novamente. Na verdade, esse tema sempre aparece na minha vida com outras máscaras. Fico pensando obsessivamente sobre algum assunto e quando dou por mim, é sobre o vazio que preciso falar. Os assuntos são meras notas, disfarces pra tentar encobrir aquilo que nunca pode ser coberto. Ele vive em mim, ele está em mim, ele não passa. Não morre, não dorme, não desperta. Esteve aqui desde sempre comigo. É meu eterno companheiro, desolador. O que faço com esse maldito companheiro?

Bem verdade que tento encarná-lo na pele de homens com quem saio e fico achando que a culpa para esse sentimento esquisito que mora aqui são sempre eles. É o fulano que não me ligou, que não me procurou, que não me mandou mensagem. É o fulano que não compreende o que sinto, minhas inseguranças, meus medos. É o fulano que não respondeu como eu imaginava, que não veio de cavalo branco com roupagem de príncipe encantado. Pobre fulano… Sempre culpado, não passa de mero figurante nesse filme.

E hoje não foi diferente. Cheguei em casa depois de um longo dia de trabalho e no caminho já me dei conta de uma inquietude perversa. Algo me incomodava, parecia vivo dentro de mim. Aí penso em quem? No fulano, claro! Foi ele que não me ligou, que não me procurou ou não falou a frase correta que eu esperava ouvir. Só pode ser por conta dele, quem mais? O que mais? O resto de minha vida está caminhando regularmente bem. No trabalho tudo ok, mundo financeiro organizado (na medida do possível), não devo nada a ninguém nem esqueci de ligar ou de comparecer a compromisso nenhum. Só pode ser o fulano!

Claro que esse fulano complica um pouco a minha vida. Estamos num começo e eles nunca são seguros. Nunca tem nada certo ou declarado, a insegurança reina em minha vida agora e sempre. Não me prometeu nada, não se comprometeu. Mas deveria? Saímos não tem nem um mês, o que esperar desse fulano? Se ele já quisesse me dar flores e uma aliança eu sairia correndo, bem me conheço… Só que se ele não liga quando espero, me desfaço em pensamentos terríveis sobre como ele no fundo só está me usando, como me acha gorda, me odeia ou só me quer como passatempo. Sim, eu sou cruel comigo, a pior!

E enquanto estou xingando mentalmente o fulano por todas as desavenças que tive com ele dentro apenas da minha cabeça, me pego trocando o nome dele por diversos nomes de antigos fulanos que passaram por mim. “Aquele maldito sicrano, ops, maldito beltrano, não, siclano!… Ai meu deus!”. E o nome dele não sai. Começo a rir no banho e finalmente percebo que quem eu xingo, quem amaldiçoo e com quem me ressinto não é o fulano ou variações, mas meu próprio vazio, que homem nenhum pode preencher (nem mulher, diga-se de passagem). É um vazio próprio, aquele que sempre me lembra que o mundo se move, gira, não para. Que eu me movimento e estou viva. Que preciso desse furo no meio justamente pra me manter viva. Que sem ele eu morro. E com ele, morro um pouquinho também. É ele quem me permite viver e ao mesmo tempo me mata um pedaço a cada minuto.

(Uma amiga que não quis se identificar é a autora)

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